JUAZEIRO DO NORTE, NA ÉPOCA, TABULEIRO GRANDE.

JUAZEIRO DO NORTE, NA ÉPOCA, TABULEIRO GRANDE.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

CABRA MARCADO PARA MORRER : LUTA DAS LIGAS CAMPONESAS

RESUMO
Este artigo vem a estampar o filme Cabra Marcado para Morrer, e em seguida é feita uma discussão teórica, com alguns autores elecandos na disciplina de História do Brasil IV, que tem a frente a professora Francisca Anselmo . Tais autores são: Caio Navarro Toledo, Marcos Napolitano e José Murilo de Carvalho. Em fevereiro de 1964 inicia-se a produção de Cabra Marcado Para Morrer, que contaria a história política do líder da liga camponesa de Sapé (Paraíba), João Pedro Teixeira, assassinado em 1962. No entanto, com o golpe de 31 de março, as forças militares cercam a locação no engenho da Galiléia e interrompem as filmagens. Dezessete anos depois, o diretor Eduardo Coutinho volta à região e reencontra a viúva de João Pedro, Elisabeth Teixeira - que até então vivia na clandestinidade - e muitos dos outros camponeses que haviam atuado no filme antes brutalmente interrompido. 
Palavras-chave: Ligas Camponesas, UNE, Regime Militar.
INTRODUÇÃO
                As Ligas Camponesas vinham sendo criadas desde meados dos anos 50 com o objetivo de conscientizar e mobilizar o trabalhador rural na defesa da reforma agrária. Durante o governo de João Goulart (1961-64), o número dessas associações cresceu muito e, junto com elas, também se multiplicavam os sindicatos rurais. Os camponeses, organizados nessas ligas ou em sindicatos ganharam mais força política para exigir melhores condições de vida e de trabalho. Toledo explana:
O reformismo nacionalista constituiu a grande utopia do final dos anos 50 e início dos anos 60. Se no Congresso Nacional o principal baluarte do movimento reformista era a FPN-Frente Nacional Parlamentar, na sociedade civil foram as organizações de trabalhadores urbanos e rurais aquelas que mais se comprometeram com a proposta de transformar o subdesenvolvimento nacional em desenvolvimento. Essas organizações empenharam-se na luta pela efetização de políticas públicas reformistas e pela promulgação de leis protecionistas das riquezas naturais, bem como dos investimentos do capital nacional . (TOLEDO, 1997, p.61).
                A renúncia de Jânio Quadros em 25 de agosto de 1961, após apenas sete meses de governo, abriu uma grave crise política, já que seu vice, João Goulart, não era aceito pela UDN e pelos militares, que o acusavam de promover agitação social e de ser simpático ao comunismo. Assim como esses setores eram contrários à posse de Jango, existiam outros que defendiam o cumprimento da Constituição, como o governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola.
                O impasse foi resolvido com a adoção do regime parlamentarista de governo, aprovado pelo Congresso. Com esse regime, Jango era apenas chefe de Estado, sendo que o poder efetivo de decisão estava nas mãos de um primeiro-ministro escolhido pelos deputados e senadores.
                Diante da crise econômica, o regime parlamentarista imposto pelos conservadores, se mostrava ineficiente, com a sucessão de vários primeiros-ministros, sem que a crise fosse atenuada. Esse cenário fortalecerá o restabelecimento do presidencialismo, conquistado através de um plebiscito em 6 de janeiro de 1963. Reassumindo a plenitude de seus poderes, Jango lançou as reformas de base apoiadas por grupos nacionalistas e de esquerda. Elas incluíam a reforma agrária, a reforma do sistema bancário, a reforma tributária e a reforma eleitoral. Segundo Carvalho:
 Como em 1937, o rápido aumento da participação política levou em 1964 a uma reação defensiva e á imposição de um regime ditatorial em que os direitos civis e políticos foram restringidos pela violência. Os dois períodos se assemelham ainda pela ênfase dada aos direitos sociais, agora estendidos aos trabalhadores rurais, e pela forte atuação do Estado na promoção do desenvolvimento econômico. Pelo lado político, a diferença entre eles foi a manutenção das eleições no regime implantado em 1964  .(CARVALHO, 2002, p. 157).
                Muitos comícios foram organizados em apoio às reformas, destacando-se um comício-gigante realizado na Central do Brasil do Rio de Janeiro em 13 de março. A mobilização popular nos comícios assustava as elites que, articuladas com as forças armadas e apoiadas pelos setores mais conservadores da Igreja, desferiram um golpe de Estado em 31 de março de 1964.
                No dia seguinte, o controle dos militares sobre o país era total e, no dia 4, Goulart se auto-exilou no Uruguai, sem impor qualquer resistência aos golpistas, temendo talvez o início de uma guerra civil no país.
                Iniciava-se assim um dos períodos mais obscuros da história do Brasil, com 21 anos de ditadura militar que promoveu uma violenta onda de repressão sobre os movimentos de oposição, além de ter gerado uma maior concentração de renda, agravando a questão social, produzindo mais fome e miséria. Os "anos de chumbo" da ditadura ocorreram após o AI5 (Ato Institucional número 5), no final do governo Costa e Silva (1968), estendendo-se por todo governo Médici (1969-1974).
O PAPEL DA UNE
                Desde o ano de 1962, a União Nacional do Estudantes-UNE, ao elaborar o seu manifesto, continha a necessidade da reforma universitária, também ensejavam um projeto político-cultural, através de seu Centro Popular de Cultura-CPC-a UNE volante,  onde visavam estampar os reais problemas sociais e políticos do Brasil, através da esferas artisticas, tal quais, o cinema, arte e a música, revestidos de uma roupagem nacional popular. Grande parte destes membros, segundo Napolitano, eram oriundos do Partido Comunista do Brasil, e ainda:
Eram jovens, quase sempre estudantes e artistas os que se articularam, a partir de 1961, em torno da UNE, e passaram a defender que a entidade tivesse uma política cultural mais atuante. O ponto comum entre eles era defesa do nacional-popular, expressão que designava, ao mesmo tempo, uma cultura política e uma cultura política e uma política cultural das esquerdas, cujo sentido poderia ser traduzido na busca de expressão simbólica da nacionalidade, que não deveria ser reduzida ao regional folclorizado (que representava uma parte da nação), nem com padrões universais da cultura humanística-como na cultura das elites burguesas, por exemplo . (NAPOLITANO, 2001, P. 37).
                Dentro dessa perspectiva o cinema poderia ser utilizado com elemento de condução ideológica em busca das massas e de tentar trazer a opinião pública em geral em torno dos reais problemas que passava a população brasileira no início dos anos 60. Como pano de fundo, o CPC da UNE vai elencar as lutas dos camponeses nordestinos, em particular no Estado da Paraíba, na cidade de Sapé, Zona da Mata nordestina, nas nascentes ligas camponesas.
                Ao passo que a UNE vai conduzindo sua bandeira, através da arte cinematográfica, vai encontrar um clima socil político hostil, em virtude da implantação do Regime Militar de 64, que não só extingue os partidos de esquerda, como também persegue e fecha os diversos aparelhos ideológicos, a exemplo do cinema, que possam contrariar a política de controle das massas. CARVALHO  (2002) enaltece: Os órgãos estudantis e sindicais também foram alvo da ação repressiva. Nesse sentido, o CPC da UNE consegue gravar as primeiras cenas de Cabra Marcado Para Morrer, sendo impedido pelas forças de repressão do regime autoritário de 64.
CABRA MARCADO PARA MORRER
                A partir de abril de 1962, O CPC da UNE volante faz uma incursão sobre Nordeste tentando montar sua primeira cenografia ideológica através de um longa metragem, mostrando a situação social e política brasileira, tendo como pano de fundo, a luta dos agricultores, na Associação dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas-Liga Camponesa, no município de Sapé, Estado da Paraíba. 
                A região foi descoberta pela UNE, devido a história da luta dos trabalhadores camponeses contra os grandes proprietários de terras, que eram explorados sob aumento no valor de foros, trabalho obrigatório sem pagamento, despejo sem idenização e violência contra os trabalhadores. A UNE volante, através do diretor Eduardo Coutinho, teria encontrado alí um fato histórico de vital inportância para o início de suas filmagens.
                Coutinho toma conhecimento que, em fins de março de 1962, aconteceu um crime de grande impacto, quando o agricultor João Pedro Teixeira, de 44 anos de idade, fundador e líder da Liga Camponesa de Sapé, que possuía mais de 7.000 sócios, foi assassinado a mando de propritários terras daquela região. João Pedro forjou a unidade dos agricultores contra a exploração dos grandes laifundiários.
                Após uma prévia pesquisa, o CPC da UNE, faz uma série de entrevistas, e resolve montar o roteiro do filme. A principal protagonista é a viúva Elizabeth Teixeira, esposa de João Pedro, e consequentemente de atores locais, sendo que muito deles participaravam dos movimentos das Ligas Camponesas de Sapé. O local das filmagens, é também no próprio teatro dos acontecimentos, onde João Pedro atuava como líder. Segundo proposta do CPC da UNE indaga Napolitano:
O procedimento de criação sujerida visava o artista intelectual engajado para a busca de inspiração nas "regras e modelos dos símbolos e critérios de apreciação" das classes populares (camponeses, operários) portadores inconscientes da expressão genuinamente nacional. O objetivo era facilitar a comunicação com as massas, mesmo com o prejuízo da sua expressão artística, a partir de procedimentos básicos: 1) adaptando-se aos efeitos da fala do povo; 2) submetendo-se aos imperativos ideológicos populares; 3) entendendo a linguagem como meio e não como fim . NAPOLITANO (2001, pág. 39).
                O início do longa metragem Cabra Marcado para morrer começa com a mostragem de algumas imagens de cenas de cidades interioranas do Nordeste brasileiro, ou seja, de feiras livres, garotos coletando carangueijos, com um cenário de pobreza extremamente causticante. Como fundo musical o CPC faz uma adpatação de uma das músicas do LP O Povo Canta, de Carlos Lyra e Francisco de Assis, fazendo parte também de um dos canais ideológicos produzidos pela UNE, na utilização da musica como instrumento de comunicação com as massas. Detalhes da música pesquisado no site do jornalista Franklin Martins :
 “O Brasil é uma terra de amores,
Alcatifada de flores,
Onde a brisa fala amores,
Nas lindas tardes de abril.
Correi pras bandas do Sul.
Debaixo de um céu de anil,
Encontrareis um gigante deitado:
Santa Cruz, hoje o Brasil.
Mas um dia o gigante despertou (ooaahhh!).
Deixou de ser gigante adormecido.
E dele um anão se levantou.
Era um país subdesenvolvido
Subdesenvolvido, subdesenvolvido, subdesenvolvido, subdesenvolvido (bis)
E passado o período colonial,
O país passou a ser um bom quintal.
E depois de dada a conta a Portugal
Instalou-se o latifúndio nacional .. (Ai)
Subdesenvolvido, subdesenvolvido, subdesenvolvido, subdesenvolvido.
Então o bravo brasileiro (iehéé),
Em perigos e guerras esforçados (iehéé),
Mais que prometia a força humana
Plantou couve, colheu banana.
Bravo esforço do povo brasileiro
Mandou vir capital lá do estrangeiro.
Subdesenvolvido, subdesenvolvido, subdesenvolvido, subdesenvolvido.
As nações do mundo para cá mandaram
Seus capitais tão desinteressados.
As nações coitadas só queriam ajudar, não é?
Aquela ilha velha não roubou ninguém,
País de poucas terras só nos fez um bem
Um Big Ben
Um big ben , bom, bem, bom
Nos deu luz (ah)
Tirou ouro (oh)
Nos deu trem (ah)
Mas levou o nosso tesouro
Subdesenvolvido, subdesenvolvido, subdesenvolvido, subdesenvolvido.
Mas data houve em que se acabaram os tempos duros e sofridos
Porque um dia aqui chegaram os capitais dos países amigos.
País amigo, desenvolvido,
País amigo, país amigo,
Amigo do subdesenvolvido
País amigo, país amigo.
E os nossos amigos americanos
Com muita fé, com muita fé,
Nos deram dinheiro e nos plantamos
Só café, só café.
É uma terra em que se plantando tudo dá.
Pode-se plantar tudo que quiser
Mas eles resolveram que nos devíamos plantar
Só café, só café
Bento que bento o frade, frade.
Na boca do forno, forno.
Tirai um bolo, bolo
Fareis tudo que seu mestre mandar?
Faremos todos, faremos todos, faremos todos.
Começaram a nos vender e nos comprar.
Comprar borracha, vender pneu.
Comprar minério, vender navio.
Pra nossa vela, vender pavio.
Só mandaram o que sobrou de lá:
Matéria plástica, que entusiástica,
Que coisa elástica, que coisa drástica,
Rock balada, filme de mocinho,
Ar refrigerado e chiclete de bola (pop)
E coca cola.
Subdesenvolvido, subdesenvolvido, subdesenvolvido, subdesenvolvido.
O povo brasileiro tem personalidade.
Não se impressiona com facilidade
Embora pense como americano
“Uuuuuuu, I’m going to kill that indian before he kills me (pinim...)
Embora dance como americano
Ta-ta-ta-ta, ta-ta-ta-ta
Embora cante como americano
Eh boi, lá, lá, lá,
Eh roçado bão, lá, lá, lá,
O melhor do meu sertão, lá, lá, lá
Comeram o boi.
O povo brasileiro, embora pense, cante e dance como americano
Não come como americano,
Não bebe como americano,
Vive menos, sofre mais
Isso é muito importante
Muito mais do que importante
Pois difere o brasileiro dos demais
Personalidade, personalidade, personalidade sem igual,
Porém,
Subdesenvolvida, subdesenvolvida,
Essa é que é a vida nacional.”
Autor: Carlos Lyra e Francisco de Assis
Intérprete: CPC da UNE
                Napolitano comenta:
"O Subdesenvolvido", a música mais famosa do LP, tematiza as agressões imperialistas sofridas pelo Brasil, construindo-se como uma espécie de suite (fado, marcha, valsa, fox e rock balada) cortada pelo bordão "subdesenvolvido", cantado em coro. A letra oscila entre a denúncia e o deboche, remetendo á tradição do teatro de revisa carioca (aliás, uma das fontes de certas canções engajadas daquele período) . NAPOLITANO (2001, p. 39).
                O projeto para a realização das filmagens em Sapé foi cancelado devido a realização um conflito entre empregados de uma usina e de camponeses, em 15 de janeiro de 1964. A Polícia Militar da Paraíba entra em cena, faz algumas prisões, e registra a morte de camponeses. Coutinho se ver obrigado a mudar o palco de sua cenografia para a região de Vitória de Santo Antão, no Estado do Pernambuco, distante cinquenta quilômetros do Recife, no histórico Engenho de Galileia, teatro de um dos principais movimentos de luta pela posse da terra, e de onde nasceu a primeira Liga Camponesa , em 1955.
                Em 26 de fevereiro de 1964, já em Pernambuco, começa o trabalho de filmagem. Pouco tempo depois, há 35 dias, já começado o roteiro do filme, estoura o regime militar em 31 de março de 1964. Dada a proposta do papel ideológico de Cabra Marcado para Morrer, que visava denunciar os maus tratos dos latifundiários contra os camponeses e a inércia do governo, que culminava naquele momento com a Ditadura dos militares, foi o bastante para ser apreendida as películas e a prisão de membros do CPC da UNE. Carvalho indaga:
A censura á imprensa eliminou a liberdade de opinião; não havia liberdade de reunião; os partidos eram regulados e controlados pelo governo; os sindicatos estavam sob constante ameaça de intervenção; era proibido fazer greves; o direito de defesa era cerceado pelas prisões arbitrárias; a justiça militar julgava crimes civis; a inviolabilidade do lar e da correspondência não existia; a integridade física era violada pela tortura nos cárceres do governo; o próprio direito à vida era desrespeitado. As famílias de muitas das vítimas até hoje não tiveram esclarecidas as circunstâncias das mortes e os locais de sepultamento. Foram anos de sobressalto e medo, em que os órgãos de informação e segurança agiam sem nenhum controle . CARVALHO (2002, pág. 165).
                Instaurado o regime de exceção começou o expurgo de elementos contra o sistema autoritário. Grande parte dos membros da UNE tinham formação ideológica de esquerda, principalmente oriundos do PCB - Partido Comunista Brasileiro. Como uma das justificativas utilizadas para a instauração do regime de 64 foi justamente o perigo comunista, não restava dúvida para o governo vigente que a UNE tornava-se uma tormenta para a aprovação de seus atos institucionais.
                Alguns dos negativos foram escondidos, enviados ao  laboratório no Rio de Janeiro, como também de algumas fotografias de cena. Com a abertura política no final da Ditadura, Eduardo Coutinho ver a possibilidade de dar continuidade ao seu projeto de filmagem, quando ressuscita Cabra Marcado para Morrer, em fevereiro de 1981, depois de um corte de dezessete anos,.
                A partir deste momento a equipe do CPC da UNE, depois de ter sofrido na clandestinidade, agonizando enquanto durou o regime militar, ainda com o diretor Eduardo Coutinho, começa outra maratona, em busca dos possíveis atores da primeira proposta do filme, o que vai ser difícil, em virtude da morte de alguns membros do período.
                Numa tentativa de reconstituir o seu projeto original, Coutinho retorna a região do Engenho Galileia, e na busca de entrevistar alguns possíveis atores da época, acaba se aprofundando na história do movimento da Liga, do papel desta, como coadjuvante na criação de outra ligas de camponesas na região.  Acaba também por descobrir nomes de grande envergadura, a exemplo do Advogado Francisco Julião, grande defensor nas lutas das ligas camponesas na região do Pernambuco.
                Coutinho faz uma corrida exaustiva, pois o Regime militar de 64 teria acabado com as tentativas de lutas dos camponeses, além da prática de muita prisão, muitos elementos daqueles movimentos tiveram que abandonar suas terras natal, e se refugiados em outros lugares do país, a exemplo da viúva Elisabeth Teixeira, que vai ser encontrada na Paraíba, no município de São Rafael, com o nome de batismo negado, utilizando-se de um pseudônimo de Marta Maria da Costa. Acompanhada de um de seus filhos, que é radialista na região. Elisabete Teixeira ainda guarda remorso de ser descoberta, em virtude do mal psicológico que os governos militares implantaram sob seus aparelhos repressores durante o seu regime de opressão.
                A tentativa de continuar o projeto de Cabra Marcado para Morrer de Coutinho, acabou o  levando a recolher uma série de depoimentos de atores da primeira filmagem. Em lugares distantes e diferentes, tais depoimentos serviram para fazer juntada ao primeiro roteiro. Recheados de experiências negativas, aqueles depoentes expuseram suas repulsas, seus tormentos, suas percas de familiares assassinadas pelo governo, como também do cerceamento de seus sonhos e possibilidades de terem uma vida melhor, numa região profundamente marcada pelas desigualdades sociais.
                Mesmo num momento em que as liberdades democráticas começavam a serem recuperadas, e que alguns  conceitos anteriores já começavam a ser revisados, a exemplo do papel do socialismo, Eduardo Coutinho continua na sua empreitada. Mesmo que tivesse acontecido a mudança de alguns conceitos, o que na verdade continuava e de forma crescente eram a miséria, a fome, o desemprego, a exploração no campo, o que encorajava Coutinho a continuar seu projeto. Cabra Marcado para morrer ainda tinha validade histórica, pela continuidade dos mesmos problemas sociais e econômicos, por todo o Brasil.
                Os militares legaram ao país uma dívida externa de crescimento estratosférico, e um processo de desigualdade cada vez maior, e uma inflação que encarecia as classes mais pobres, e principalmente ao homem do campo. Mesmo com conquistas sociais o regime militar repassou a sociedade civil, no processo de redemocratização, um país profundamente esfacelado na sua economia e com problemas crônicos na sua esfera social.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
                Cabra marcado para morrer tem uma importância muito grande para o acervo memorial do Brasil, pelo fato de estampar os nossos traumas políticos, que alteram drasticamente a vida das pessoas em sociedade.
                Ao analisarmos um documentário dessa amplitude, enxergamos a gama de possibilidades políticas que foram  reprimidas  e que podiam ter mudado o quadro social do povo de uma forma geral.
                Observamos também, de onde nasce certos preconceitos, certas marginalizações, que por tanto tempo ficou na mente da sociedade brasileira, mesmo com a abertura política em 1979. Ainda hoje, os movimentos de reivindicação na luta pela posse da terra,  da moradia, por exemplo, ainda são marginalizados pela mídia, que os tratam como elementos subversivos a ordem pública em geral.
                Além da importância memorialística, Cabra Marcado para Morrer, tem um papel de mais-valia, para ser visualizado, principalmente pelo nosso público estudantil, que é tão carente da história dos movimentos populares. O processo de luta da classe trabalhadora, seja na cidade, seja no campo, tem continuidade histórica, mudando apenas de atores no decorrer do tempo.
                A medida que se dar continuidade ao processo de desigualdade social no interior de uma sociedade, vão também surgir as diversas formas de reação, que dependem das armas que estas podem utilizar para conseguirem seus intentos. Naquele recorte histórico, período da ditadura de 64, o elenco de Cabra Marcado para Morrer, as armas de reação seriam o a ideologia, a luta "sindical" (sob forma de ligas), e a principal arma que era o voto, más que foram brutalmente cerceados.
                Ao olharmos a conjuntura atual de nossa sociedade brasileira, vemos que por causas da luta destes e de outros no período ditatorial, quando lutaram, foram presos e até morreram, e resultou no restabelecimento de nossa possibilidade de lutar, que são as liberdades democráticas e de imprensa (ideologia). Aqui perguntamos, o que podemos fazer com essas armas tidas de volta para que possamos lutar pela redução das desigualdades em nossa atual sociedade? Findamos com a tentativa de provocar o debate acerca do nosso papel junto aos problemas sociais de então. 
( Artigo publicado pelos alunos: Arlindo, Marcos, Janielide, Adriano, Sandra, Anderson e Gislaine do 8º Semestre do Curso de História - Noite- 2010).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 3.ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2002.
COUTINHO, Eduardo. Cabra Marcado para Morrer: Documentário. 120 min. Brasil, Globo Vídeo, 1984.
 NAPOLITANO, Marcos. Cultura brasileira: utopia e massificação (1950-1980). São Paulo: Contexto, 2001.
WWW.franklinmartins.com.br : Acesso em 12 de julho de 2010.
TOLEDO, Caio Navarro (Org.). 1964: Visões críticas do golpe: democracia e reforma do populismo. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1997.

Nenhum comentário:

Postar um comentário